Resenha de “O Inverno das Fadas” pelo Leitora Viciada

A querida Tatiana Jiménez fez uma resenha COMPLETÍSSIMA e MARAVILHOSA de “O Inverno das Fadas”em seu blog Leitora Viciada. Merece ser lida e comentada! Vamos lá? E ainda está rolando SORTEIO!!

Link original:

http://www.leitoraviciada.com/2012/08/o-inverno-das-fadas-de-carolina-munhoz.html

 

Resenha:

Ainda não li o primeiro romance da Carolina Munhóz, que lhe rendeu o título de melhor escritora jovem de 2011 pelo Prêmio Jovem Brasileiro. Mesmo desconhecendo A Fada, iniciei a leitura de O Inverno das Fadas com enormes expectativas, porque encontrei muitas críticas favoráveis à jovem, bonita e simpática escritora. Com este livro garanto que além de totalmente original, criativa e inovadora, Carolina é muito talentosa. Com esta resenha irei explicar o porquê de cada elogio.
Posso ser ousada, mas é minha opinião: se Marion Zimmer Bradley estivesse viva, fosse brasileira e tivesse a mesma idade da Carolina, talvez o resultado de seu trabalho fosse semelhante ao de O Inverno das Fadas.

Não que Carolina não tenha seu próprio estilo, ela tem, e bastante! Mas existem semelhanças de sua obra com algumas da Marion, como a mitologia celta, véus mágicos entre dimensões, magia e forças da natureza em ação, mulheres protagonistas fortes e poderosas, batalhas místicas e nenhum preconceito quanto às vontades e atos das personagens; só que com um ar muito mais jovem, atual e pop. Afinal, Marion faleceu em 1999 e suas obras são antigas.
O Inverno das Fadas traz magia, sensualidade, modernidade e sentimentos muito intensos. É sexy e inteligente. É mágico e instigante, mas com mensagens e sentimentos muito reais. Não o considero um simples livro YA (Young Adult, Adulto Jovem), porque possui mais complexidade em suas páginas para leitores mais atentos.

Antes de tudo: se você não é um especialista em fadas, em cultura e mitologia celta, jogue fora todas as imagens e informações sobre esses seres mágicos da cabeça. Limpe sua mente de julgamentos pré-estabelecidos e se prepare para entrar num mundo de fadas totalmente diferente e muito mais real do que o que estamos acostumados a ver. Uma mitologia bem organizada e diversificada, interessante e menos infantil do que encontramos nas histórias.

A originalidade da obra: a autora saiu do “lugar-comum” dos contos de fadas. Ela buscou a fundo criar e reproduzir lendas do folclore celta rústico. Mostra ao leitor que as fadas não são iguais, que existem vários tipos, com poderes, dons e funções diferentes. Não existe apenas aquela típica fadinha boa nem apenas fadas-madrinhas protetoras. Existem Banshees, Súcubos e outros tipos de fadas.
O destaque fica para a Leanan Sídhe, uma fada muito mais obscura, sensual e completamente fatal. Sophia, a protagonista do livro é uma fada desse tipo; e não para por aí: sua diferença não é apenas ser uma fada rara e diferente; sua origem é mais complexa do que as de todas as outras Leanan Sídhe! Não contarei, leiam e descubram.

Uma Leanan Sídhe é uma fada que vive da energia de humanos, suas caças. É uma musa inspiradora com beleza fora do comum e irresistivelmente atraente. Ela oferece para um artista inspiração ilimitada e muito sucesso em suas criações e trabalhos em troca de seu amor, devoção e energia vital. No entanto, a vítima freqüentemente enlouquece e tem uma vida intensa, de enorme sucesso, deixa sua marca na História e morre prematuramente, quase sempre no auge da carreira. Conforme a fada inspira a pessoa e a seduz, suga a vida da presa.
Essa é a função dela para o equilíbrio do mundo. Cada fada segue seus instintos e deveres conforme sua natureza. Portanto, o leitor encontrará uma fada folcloricamente diferente do comum.

Além de ser original ao abordar um tema que já está batido na Literatura YA da atualidade (podemos até concluir que as fadas estão na moda, assim como os anjos e as sociedades distópicas) utilizando uma mitologia quase que inédita para a maioria dos leitores, com uma estrutura excelente, Carolina é criativa. Afinal, não é qualquer escritor (a) que consegue transformar um tema simples, famoso e clichê numa história diferente, apaixonante e marcante.

Inovação: presente na união da mitologia feérica ao mundo pop atual. No decorrer do livro conhecemos as vítimas de Sophia através de flashbacks, que na verdade são referências a artistas que realmente deixaram fãs e trabalhos inesquecíveis em suas respectivas áreas.
A autora prestou homenagem a esses artistas, assim como também alerta como suas vidas se foram; talentos perdidos em meio a overdoses, suicídios, distúrbios psicológicos, depressão, solidão…
Como humanos talentosos da vida real morreram perante a mídia, e quantos outros percebemos estarem doentes, enquanto outros nos surpreendem com suas mortes fulminantes? Não apenas jovens famosos, mas a autora também alerta sobre quantos outros morrem e não são noticiados por serem desconhecidos.
Através de algumas personagens secundárias, jovens da região onde se centra a história no mundo dos humanos, a autora também ressalta como o abuso de drogas e álcool é cada vez mais comum. É um alerta!

Notamos Heath Ledger, Amy Winehouse, Britanny Murphy, Raul Seixas, Michael Jackson, Kurt Cobain e muitos outros homenageados – É claro, são apenas referências, mas não há como não fazer comparações. Além de citar escritores como George R. R. Martin, J. K. Rowling, J. R. R. Tolkien, Marion Zimmer Bradley e outros, cada capítulo contém um título. Na última página existe a listagem de cada capítulo e descobrimos serem frases ou trechos (sempre traduzidos) de músicas de artistas como Linkin Park, Kelly Clarkson, Adele, Nirvana ou Evanescence. Ou seja, é um livro que une a mitologia antiga dos celtas com toda a sua tradição ao mundo jovem atual, moderno e pop.
Existe uma personagem enigmática que surge no decorrer do livro, imaginei quem ele seria… Bom, pelo menos na minha cabeça!

O talento: Carolina constrói cenas mágicas tão realistas que parecem verdadeiras; cenas comoventes que afetam o leitor. As dimensões, seres e encantamentos são descritos em detalhes. A narrativa da autora é aconchegante, o leitor se sente rapidamente bem ambientado ao enredo.
É o tipo de escritora que consegue passar tantas informações através das cenas, ambientes, atos e personagens. Não é do tipo que enche o leitor de informações e deixa o livro entediante. Ela mostra com naturalidade, não explica demais. E isso é o que mais admiro num escritor. Rapidamente entramos no clima da história e conhecemos as personagens.

No entanto, além de demonstrar minha opinião sobre o talento da Carolina, existem outros pontos a serem notados no livro. Primeiramente que é uma obra bela como um todo. Não apenas no conteúdo, mas também na diagramação, revisão, qualidade gráfica e estrutura do texto. Gostei das divisões dos capítulos, das pausas, da fonte e não encontrei erros. A capa, que foi escolhida através de votação popular é muito linda e demonstra uma cena muito específica – uma das que mais gostei de todo o livro! O trabalho da editora me agradou por completo.

Às vezes a autora faz um pequeno retorno aos breves acontecimentos como uma recapitulação dos mais importantes. Faz de forma discreta e breve, porém não vi necessidade disso ocorrer no começo de alguns capítulos. Uma manobra para manter alguns leitores distraídos atentos. Alguns nem irão reparar nesse detalhe. No entanto, quando ocorre (poucas vezes) não atrapalha o ritmo da narrativa; ressalto que não é um defeito, apenas algo que achei desnecessário.

A narrativa é em terceira pessoa e a autora nos mostra diferentes pontos de vista, sempre focados no casal principal e na missão de Sophia, que acaba se tornando um romance, um desastre para a “fada vampira”.
O romance impossível que é fator dominante nos livros YA está em O Inverno das Fadas. Apesar de o começo ter me passado a impressão de ser algo um pouco forçado, percebi que a magia provocou isso; e o romance dos dois ultrapassa as barreiras dos encantamentos para mostrar que é amor verdadeiro.

Como uma Leanan Sídhe poderá amar um simples humano sem levá-lo à morte lenta por absorver sua energia ou suicídio por não suportar mais o sofrimento? Como estar ao lado dele sabendo que é o motivo de sua dor? E como se afastar completamente dele e morrer?

O que para Sophia parece ser um acidente (pois uma Leanan Sídhe nunca se apaixona, muito menos ama uma presa) pode ser algo mais valioso. Talvez, William, o jovem escritor que ela deveria seduzir e influenciar a escrever um best-seller seja a sua alma gêmea. O que era para ser mais um trabalho difícil, porém comum, torna-se amor arrebatador. Era para ser simples: ir à dimensão dos humanos, seduzir um rapaz humilde, mas inteligente e já talentoso, através de sua beleza e habilidades sexuais e depois sugar a vida dele. Porém se torna uma jornada implacável e tortuosa, que modifica não apenas a vida do casal, mas a de outras pessoas e seres mágicos; mexe com o equilíbrio natural da magia entre os mundos.

William é a personagem por quem as leitoras irão se apaixonar, porque além de talentoso, ele é corajoso e mesmo sem poderes, o humano comum enfrenta por sua amada forças que ele desconhece completamente. A autora cria um romance que agrada os mais românticos, adoradores de amores impossíveis, mas cria outros fatores na história.

Já Sophia não seduz apenas William; seduz os leitores. Impossível ler cada acontecimento e ficar sem se emocionar e torcer por ela. Ao mesmo tempo em que ela parece uma assassina fria, aos poucos percebemos o quanto na verdade ela sofre com essa sina.
Adoro protagonistas que aparentemente parecem vilões, maus ou anti-heróis e aos poucos vão te cativando, te envolvendo até aflorar sua verdadeira essência. Então encontramos os verdadeiros e mais marcantes heróis. Assim é Sophia, a Leanan Sídhe.

Parênteses na análise da protagonista: a complexidade/sina me lembrou, em parte, a personagem Vampira (Rogue) das histórias em quadrinhos dos X-Men da Marvel. Ambas não podem evitar sugar a energia de quem as ama. Sophia é um ser feito para seduzir, tanto fisicamente quanto psicologicamente e matar seu amante e necessita disso para viver; Vampira nasceu com um dom mutante que não lhe permite amar fisicamente e qualquer toque em sua pele fere e pode ser letal, também absorvendo a vida da pessoa. E ambas surgem como jovens atraentes, mortais e aparentemente vilãs que depois nos levam às lágrimas e comoção total. Sophia é para mim uma das melhores heroínas da Literatura Nacional, pois possui inúmeras facetas, é imprevisível e evolui muito ao descobrir o amor.

Uma mensagem que captei no livro é de como romper nossas próprias barreiras e limites, ampliarmos nossos horizontes e lutarmos por nossos sonhos e desejos. Não devemos ser o que querem que sejamos e sim o que desejamos ser. Não devemos ser passivos e aceitar o que a sociedade e às vezes a família e outras pessoas ao nosso redor nos impõem. Temos de conquistar o que desejamos, e não aceitar o que nos é dado.
Essa é a principal batalha de Sophia: ela luta contra a própria natureza por amor, mesmo sendo impossível. Ela não aceita tradições, regras, ordens e dogmas; ela os enfrenta de todas as formas que consegue em busca do bem e da possibilidade que parece inalcançável de estar ao lado do seu amor sem riscos para ninguém.

Carrega um fardo grande demais, um dever que necessita ser continuamente executado. Qualquer um sofreria por ter essa obrigação. Pesa, dói e marca ser a responsável por tantas mortes e não poder viver de outro modo. É questão de sobrevivência, ou mata ou morre. Marca tanto que cada alma deixa uma tatuagem diferente na pele e uma ferida no coração de Sophia. Ela precisa ser mais fria e gelada que o mais rigoroso inverno; o problema é a chama do amor que surge para derreter o gelo de Sophia; ao mesmo tempo aquece e queima seu coração aos poucos.

Este livro entrou para minha lista dos preferidos, Carolina com Sophia e William também.